Meu Ursinho de Pelúcia
Nestes 18 anos que estou atuando como psicopedagoga tenho vivenciado grandes experiências no cotidiano das reabilitações com os pacientes, e nas orientações com os pais.
Tenho encontrado muitos pais que relatam sobre a sua formação profissional com o intuito de impressionar, intimidar com o seu saber, para em seguida falar sobre o (a) filho (a) e seus achismos. Durante o diálogo trazem uma dinâmica familiar perfeita, repleta de harmonia. Destacam valores e princípios que são regidos neste hemisfério.
Porém, quando o sujeito chega no consultório demonstra-se assustado, perdido, fragmentado, dependente, sempre falando do outro (pais).
Os pais auxiliam-no em tudo, até arrumar a própria alimentação. Parece que lhes são retirados (adolescentes, crianças em desenvolvimento), sem consciência, ferramentas de sobrevivência para com o outro. E assim sofrem bullyng, são rejeitados pelo grupo, são adolescentes e crianças infantilizadas. Demonstram medo no pensar, no brincar, no descobrir-se.
Os pais neste ato de proteção sem causa, empregam o valor do TER, e a ideia do SER encontra-se distante.
Que contexto familiar é este? O que desejamos para os nossos filhos? Que conduta está sendo empregada para a formação do mesmo? Que tolhimento está ocorrendo? Que filhos estamos criando para o mundo?
Percebo que a meta dos pais hoje é oferecer o melhor para os filhos, retirando-os da zona do desconforto. Proporcionando ao filho a leitura de que tudo pode, que seus desejos serão realizados. Mas, e o amanhã senhores Pais? Como o seu filho irá reagir diante de tantas cobranças e demandas que serão impostas pela sociedade.
Tolhimento cruel e dolorido por não permitir que este sujeito responda pela sua demanda, conquiste seu espaço após lutar pelo mesmo. Decida e seja respeitado em suas decisões principalmente quando esta interfere em sua construção pessoal.
Esta fatalidade tem o objetivo de atender a demanda dos pais com as metáforas – “Meu filho vai ser, fazer o que nunca fiz”. “Passei necessidades, dificuldades para chegar onde cheguei”. Dentro deste contexto não priorizam as experiências outrora vividas pelos senhores. Chegaram onde estão devido aos esforços medidos. Parabéns, o senhor é um vitorioso.
Deparo-me com crianças sendo comandadas, infantilizadas, desorganizadas. Refletindo as inabilidades dentro do contexto escolar, onde é o único lugar que lhe exigem o conhecimento, suas habilidades de pensar, organizar as informações pré-estabelecidas para a sua caminhada posterior.
Em seu contexto escolar estes pequenos sofrem por não conseguir se deparar com as faltas, falhas, pois não estão preparados para lidar com o NÃO, com o refazer.
Aqui começam as negações deste sujeito enquanto aluno, produtor de conhecimento, pois sempre teve alguém para atender seus desejos atendidos.
Cabe refletir da necessidade do ouvir, de verificar o que está acontecendo, de percebe-lo diante das suas necessidades básicas.
Com a entrada do século XXI, o valor do SER, está ficando mais distante, uma vez que a história está sendo perdida, e tentam suprir sua falta desejando ao filho o modismo do TER, e não do SER, e nesta disputa do TER, apresentam-se pais ansiosos, desejosos que este filho não os rejeitem. Desdobram-se para atender todas as necessidades dos filhos, inibindo o seu crescimento, o seu suposto sofrimento. Percebo nitidamente o quanto há um cordão unindo intensamente estes seres tão diferentes, e que são aprisionados pelo egoísmo inconsciente.
Estas adversidades têm algo em comum que regem o caráter de um ser humano, que se encontram em todos os lares, que foram experienciados pelos nossos pais e aplicados de maneira filosófica em nossa vida diária através do diálogo. Respeitar o próximo como a si mesmo, convivências sociais, e assim, construímos a história do “Eu”. Edificando princípios, valores e caráter.
Como ser humano e psicopedagoga sinto saudade daquela época. Simplesmente vivíamos, não éramos sufocados pelo desejo do outro. Havia o respeito de experienciar para amadurecer. Falávamos pouco isso é bem verdade, mas éramos ouvidos quando dialogávamos com os nossos pais, avós, tios, primos, e com nossos amigos.
Lembro-me que arrumávamos os brinquedos, e as nossas fantasias vinham à tona, ora mulher maravilha, super-homem, homem aranha. Hoje somos movidos pela era da internet, ou seja, portamos os nossos brinquedos em celulares, tablets…
Com tais atitudes algemam sua prole fazendo todos os comandos possíveis, desde o café da manhã até o momento de dormir. Nesta caminhada a linguagem diária muda, ou seja, usam as palavras no diminutivo, infantilizando-os, e nesta faceta retiram as ferramentas do amadurecer, das conquistas, de viver novas experiências, e de conviverem com o diferente.
Infelizmente não vivemos em um reinado de príncipes e princesas, e sim em um mundo onde a exigência é de oportunizar o filho a um contexto sadio. Não os coloquem em uma redoma de vidro, esquecendo-se do amanhã.
Amanhã teremos SUJEITOS que não conseguirão lidar com o NÃO, que acreditarão que o mundo gira em torno de si, das suas necessidades. Após as frustrações estas crianças passarão a apresentar quadros que demandam da assistência psicológica, psicopedagógica, psiquiátrica….
Ancorarão na negação, tornando-se vítimas do contexto familiar, tornando-se dependentes do outro.
Para sair desse rito insalubre há necessidade de deixar de ser o Ursinho de Pelúcia, provocar crises nesta esfera familiar. Crise que é transformada na busca do próprio EU. Desconstruir o que outrora fora realizado pelo outro. Assim a vida torna ao rio. O percurso iniciar-se-á com novas buscas, novos empreendimentos, novos olhares, permitindo crescimento de SER / ESTAR/ CONQUISTAR / AMADURECER para o amanhã.
A humanidade tem a necessidade de buscar sempre, amadurecer para viver, e viver um dia de cada vez. Amanhã pertence ao amanhã, o futuro pertence ao futuro e o passado as nossas lembranças, apenas isso.
Maria Masarela Marques dos Passos
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